O que fazer com o cansaço?
- fevereiro 10, 2021
- by
- Paulo Nobre
Somos chefes exigentes de nós mesmos e nos conduzimos à exaustão.
Essa talvez seja a mensagem principal da obra “A Sociedade do Cansaço” escrita pelo filósofo Byung-Chul Han, publicada pela segunda (e ampliada) vez pela Editora Vozes em 2017.
Nossa sociedade não é mais como era antigamente. Isso é uma constatação óbvia, mas o que o autor quer dizer com isso?
Bem, é que o principal traço da sociedade do século passado era a ausência (negatividade) e o da nossa atual é a presença (positividade).
Como assim?
No século XX a sociedade era marcada pelo controle e pela disciplina. A proibição e a privação impostos pelas instituições eram típicas daquele tempo. Já o século XXI é caracterizado pela produtividade e pelo desempenho que impomos a nós mesmos. Ou seja, se trata de tempos do excesso e da demasia autodirigida. O cansaço seria, portanto, a consequência dessa cultura da produtividade.
Mas o que isso tem a ver com psicanálise?
As histéricas que Freud atendia lá há 100 anos atrás eram moças que adoeciam porque eram proibidas de expressarem seus sentimentos através do pensamento ou da fala. Os sintomas apareciam no corpo através da conversão. Os adoecimentos de hoje não advêm de proibições, mas de excessos. Excesso de estímulos (TDAH), excesso de trabalho (Burnout), excesso de si mesmo (depressão). O excesso é tão presente que vira norma, e quando não é atingida, deixa o sujeito ansioso por não ter feito o suficiente. A ansiedade surge dessa “ânsia” de atingir um excesso que completaria, mas que nunca é alcançado e que gera insatisfação constante. Nada basta, não há limite. O supereu de época do Freud é punitivo e proibidor. Ele dizia “não” ao sujeito. O supereu atual exige intensidade! Ele diz “mais” ao sujeito. Mais trabalho, mais curtição, mais amor, mais estímulos, mais amizades, mais curtidas, mais, mais e mais!
E o que fazer com isso?
Para excesso de positividade, negatividade. E precisamos entender que positividade e negatividade não significam bem e mal, mas sim presença e ausência. É possível dizer “não” à produtividade e ao desempenho. Eles podem esperar! Então é necessário que haja espaço para o nada em nossas vidas, pois só assim o diferente pode aparecer e podemos sair desse “loop” narcísico. O autor do livro propõe a festa. Mas não é essa festa da demasia e do excesso que costumamos ver por aí. É o culto à celebração, ao prazer e à vida em si mesma. Outras maneiras de abrir esses espaços é fazendo análise ou meditação, por exemplo. Pode ser também fazendo algo inútil ou por pura curiosidade, apreciando fazer nada. Os italianos têm até uma expressão para isso: “il dolce far niente”.